quarta-feira, 30 de setembro de 2015

A espera




A espera é sempre um processo angustiante, mesmo quando a espera é expectável - Será que ele viria a horas como ela desejava? – A dúvida era legítima, pois não seria a primeira vez que tal lhe aconteceria, ter de esperar mais do que gostava. Contudo, algo lhe dizia que desta vez seria diferente. Estava longe de ser o primeiro por quem esperava na sua vida, afinal.

Este breve pensamento fê-la recuar anos para a sua primeira vez. Sentia-se temerosa e excitada na altura. Lembrava-se bem de como o chão tremeu. A memória não a traía, especialmente a ela que a tinha bem treinada. O seu trabalho como tradutora simultânea era um excelente exercício mental que a ajudava a manter uma atenção a todos os pormenores, a tudo o que poderia ser ou não importante. Não se podia queixar da vida afinal. Após ter terminado o seu curso rapidamente arranjou trabalho e, apesar de estar longe dos seus, a vida sorria-lhe. 

Voltou a olhar para o relógio, mas o mesmo parecia não andar. Deu por si a viajar no tempo de novo. Na sua primeira vez tudo tinha sido tão rápido que mal tinha tido tempo para saborear a viagem que ele lhe tinha proporcionado: viagem de sensações, de odores, de tremores.

Ao longo destas suas três décadas de vida já tinha alguma experiência para não se deixar ficar em ânsias, mas a verdade é que os quinze minutos iniciais de espera prevista já se tinham convertido no dobro. Será que ele viria a tempo? “Mas porque é que será que eu tenho de ser assim?”. Já se começava a irritar com esta sua maneira impaciente de ser. Ela não era assim na terra beirã que a viu nascer, por que se transformou neste bicho stressado desde que foi viver para Lisboa?

A impaciência já a tinha feito perder algumas coisas na vida. Desta vez não deitaria tudo a perder. Iria ficar ali onde era "suposto". Nada de mudanças de planos à última da hora!

E sim, já os tinha tido de vários tipos na sua vida: elegantes, modernos, sofisticados, mas também clássicos, conservadores, algo antiquados até. Contudo, a vida é feita disto mesmo, não é? De experiências, de vivências, de esperas, de encontros, de desencontros. “Tudo é vida, lembra-te disso.” Olhou para o seu smartphone de última geração: nada! Suspirou...

Ela não gostava de não ter alternativas. Considerava-se uma mulher do séc. XXI onde não há lugar para frustrações deste género. Nesse momento pensou em ir-se embora, afinal opções não lhe faltavam.

Voltou a olhar para o horizonte em vão. Bem, creio que vinte minutos de atraso chegam. Não espero mais!

Decidiu voltar costas e ir embora. Poderia não ser a mesma coisa e não era. O entusiasmo, o tremor e a emoção que sentia sempre que ele chegava seriam substituídos pela rotina, por aquilo que é certo, pela segurança, mas a vida é feita de escolhas e a dela estava feita. Não pensaria mais nisso.


Ao caminhar rua fora pelo passeio de calçada, o qual fazia questão de fazer ecoar os seus tacões, ouviu ao longe aquilo que parecia ser ele e, num ápice, deu por si a correr para trás. Sim, era mesmo! Ela sabia. Estava atrasado, mas afinal não lhe iria falhar. Ela adorava comboios e, de todos, o intercidades era o seu preferido!!!



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