domingo, 29 de maio de 2022

Dia 11 - Despedida do Uzbequistão e chegada à fantástica cidade de Cujande - 160km

Findado o almoço de trabalho de operadores turísticos para o qual fui simpaticamente convidado e onde me perguntaram com positiva curiosidade e desejo de bem fazer o que eu tinha gostado mais do Uzbequistão e como acharia que se poderia promover o destino na Europa, está na altura de negociarmos o preço do táxi que nos levaria até à fronteira com o Tajiquistão – fronteira de Oybek-Paldorak. 93km separam-nos da fronteira e acordamos o preço de 205.300 Soms, pouco menos de 20 dólares.

A estrada será o equivalente a uma estrada nacional nossa com alguns trajectos com delimitador e muitos sem. À medida que nos afastamos da capital, os veículos novos começam a escassear e a ser substituídos por carros da época soviética e alguns veículos de tracção animal, todos juntos numa via onde as regras de circulação parecem um pouco aleatórias.

Ultrapassagens duplas, ou seja, ultrapassagens a alguém que está a ultrapassar, ultrapassagens em riscos contínuos, tudo com uma enorme normalidade ou não estivéssemos nós no Uzbequistão. Curioso como o modo de conduzir aqui é tão diferente do modo de conduzir no Tajiquistão. A viagem até à fronteira serve, portanto, de despedida do estilo “fast and furious” asiático e da imensidão de Chevrolets brancos de produção nacional.

Esta fronteira tem características muito diferentes da fronteira que tinha cruzado anteriormente quando entrei no Uzbequistão. Tem um aspecto muito mais industrial e o movimento é frenético. Admito que o facto de a estar a atravessar de dia e não de noite ajude a esta minha visão.

No Uzbequistão, enquanto turistas, temos de ter documentos emitidos pelos hotéis onde pernoitamos que comprovem por onde andámos. A ideia de se ficar em casa de um local não parece colher junto das autoridades. No segundo hotel onde fiquei tentaram convencer-me que era tudo digital e que não precisaria do papel, mas preferi guardar os vários papéis e em boa hora o fiz.

No lado uzbeque, a confirmação da documentação de por onde andei e pernoitei é feita demoradamente, não havendo lugar a conversas sobre Cristiano Ronaldo ou sobre o facto de ser português. Talvez por ser uma fronteira mais industrial, a ideia de se ter um turista seja mais esdrúxula. Tratada a documentação e feito o controlo de raio-x, altura de percorrer os cerca de 400m de terra de ninguém com as malas por um percurso de alcatrão nem sempre regular e com inclinação positiva. Um bom exercício para quem nunca experimentou!

Do lado tajiquistanês, preenchimento de novo formulário de imigração, de modo eficiente, mas sem grande cordialidade e com o mínimo inglês possível. Atrás de mim uma senhora com ar de empresária parece incomodada com o facto de o meu processo estar a “empatar” o seu atendimento e travessia da fronteira. Sorrio para ela com o meu melhor sorriso Pepsodent e recebo uma cara fechada ao melhor estilo 17h59 em qualquer repartição pública que encerra às 18h00! Bem, passados os seis postos de controlo reencontro-me com o Alishir e o Sr. Sadullo, preparando-me para a viagem de 67km que me espera.


Está um final de dia nublado, o sol tem dificuldade para brilhar e o cenário é desértico com uma areia escura. A ambiência adquire um tom de ficção científica com uma fotografia cénica de excelência, pelo que a hora de caminho é feita tentando retratar de algum modo tudo o que estou a vivenciar. Confesso que, perante toda a envolvência, não considero tê-lo conseguido, pelo que aqui ficam as melhores tentativas.



Chegamos perto da hora do jantar a Cujande, cidade com 2500 anos de História desde a altura do império persa. Como todas as cidades das rotas da seda, foi tomada por vários impérios ao longo dos tempos. É a segunda maior do Tajiquistão com uma população de cerca de 181.600 pessoas, com a área metropolitana a ter quase um milhão de pessoas. A maioria da população é tajique e de religião sunita.

O hotel onde fico é grandioso, verdadeiramente grandioso, com uma vista sobre o rio Sir Dária se usarmos o nome persa ou rio Jaxartes se usarmos o nome grego.

Chegado ao quarto no sexto piso, constato que não tenho água. Volto à recepção e digo ao amável recepcionista que não tenho água corrente. Ele sorri, vai atrás do balcão e dá-me uma garrafa de água. Ah, pois…a barreira linguística…tento “no running water”, tento “no shower”, tento mais algumas expressões e o sucesso é o mesmo. Felizmente, outra hóspede no hotel ajuda-me simpaticamente e em três tempos o problema está resolvido. Como o sexto piso estava fechado e foi aberto para nós, alguém se esqueceu de abrir a torneira de segurança de todo o piso!!!

Tomo o meu duche, desço para o jantar e, mal me dirijo à recepção, o amável recepcionista tenta compensar o incómodo, devolvendo-nos parte do valor pago pela estadia. Dissemos que não era necessário e prosseguimos para o jantar. O desejo de agradar e bem fazer é mais uma vez constatado, não se privando os actores turísticos locais de agradar quem visita o país. E, acima de tudo, de tentar aprender e melhorar, como comprovaria na manhã seguinte.

Deslocamo-nos para o centro da cidade a pé, usufruindo da noite quente de Abril. O ambiente na cidade é familiar, com animação junto da fortaleza e, para minha surpresa, revela-se uma cidade lindíssima e muito bem cuidada. Apesar de ser segunda-feira, muitas famílias passeiam e passam o serão, comendo gelado e deixando as crianças brincarem livremente.




Decido experimentar uma iguaria local depois do jantar: espetada de batata-frita às rodelas com o sumo local. Digamos que não consegui comer a espetada toda e o sumo é parecido com a laranjada micaelense: demasiado doce para meu gosto.

Antes de chegar ao hotel, deparo-me com uma comitiva da ONU alojada no hotel e vou para o meu quarto.

Sinto o cansaço acumulado e a gravação que faço em áudio das aventuras do dia é recheada de bocejos incontroláveis. Assim adormeço e recupero para o maior e mais incrível dos dias desta aventura pela Ásia Central. Na próxima crónica, contar-vos-ei sobre o fantástico museu de Cujande e a espantosa história do australiano que decidiu viver no meio do nada no Tajiquistão.

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