Com reserva num restaurante local com vista sobre a Praça de Reguistão, sigo para lá sem saber bem o que iria encontrar em termos de comida ou ambiente.
O terraço onde fico sentado
comporta umas cinquenta pessoas, mas só nos encontramos quatro pessoas a jantar, apesar de ser sábado à noite.
Debruço-me sobre o varandim, por
assim dizer, e aprecio a ambiência, o ar que respiro e o que me rodeia.
Ouvem-se claramente as preces da
última oração do dia pelo sistema de som da mesquita que referi na crónica
anterior ao almoço.
Perante mim, uma tranquilidade imensa.
Vejo algumas crianças a brincar
na praça. De repente, um balão cruza o meu campo de visão com o minarete
iluminado por trás. Se a criança chora pelo balão perdido, estou demasiado
longe da praça para ouvi-lo.
Chega a comida servida em pratos cuidados, mas sem gourmetzices. Saborosa, equilibrada, é o acompanhamento perfeito para a noite de verão de que usufruo.
À medida que a refeição se prolonga, a praça enche-se cada vez com mais gente. Se não soubesse que era Ramadão e as preces se ouvissem, não diria que era Ramadão.
E aí percebi verdadeiramente
algo. Efectivamente, mais do que uma sociedade laica, é uma sociedade feliz e
tolerante. Na praça, famílias como a minha e a tua.
Por algum motivo, vem-me à
memória a canção do Sting: “I hope Russians love their children too…”, cantava
ele.
E, no fundo, todos os povos,
todas as pessoas, querem ser felizes, querem criar os seus filhos, querem que
eles cresçam saudáveis, seguros, que se concretizem em todo o seu ser.
E isso nada tem a ver com
enquadramento político, religião. Debruço-me novamente sobre o varandim e tento
absorver ao máximo tudo o que este momento me está a dar. Emociono-me!
Quando sinto que estou pronto,
agradeço ao dono do restaurante e sigo para a praça, para ao pé do minarete.
Crianças andam de trotinete ou patins em linha, as meninas com os seus rabos de cavalo, adolescentes em grupos brincam e riem, ora em surdina, ora de modo bem audível. Namorados discretos comem gelados e os pais tentam vigiar os seus filhos naquele exercício que todos os que somos pais conhecemos bem.
Inspiro mais uma vez e despeço-me da praça e de todas aquelas famílias, seguindo para a fortaleza do Emir, agora iluminada.
Deparo-me com uma casa de
“Italian Gelato” com bastante procura e, por breves momentos, viajo para a
praça dos pescadores na Costa da Caparica.
Afinal, a distância que “nos”
separa não são os cerca de 6200km que Lisboa dista de Bucara, é tão somente a
distância que construímos dentro de nós.
E com esta lição de vida finda mais um dia...
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